sexta-feira, 19 de março de 2010

Ritos de passagem.

Buscar em novos ares, novos cortes de cabelo, nova imagem, mas não se perder em um eu novo e não confundi-lo com um eu novato que já sou por excelência, sem perspectiva de escolha ou decisão. Não perder-me num eu antigo, antiquado por definição, que não é de memórias que se vive tampouco de saudade. Mas fazer, acima de tudo, desse eu novo um campo de boas perspectivas, e trazer de uma infância muito querida sensações que deixem gosto na pele, nos olhos, um cheiro anônimo que vem da panela, vozes da cozinha, conversa de família, viagem de família, coisas doces, a sensação de uma liberdade que se limitava entre o braço esquerdo do pai e o braço direito da mãe. Poderia dizer, hoje, à eles, que essas coisas fazem falta? O que se imprime em corpo e por consequencia se faz uma máscara que a gente veste aos poucos e, também aos poucos, se torna um eu verdade, é o que me separa dessa época saudável, e isso que me separa eu enxergo como uma linha cruel, um fio metálico aceso e quente, porque nessa impossibilidade de me sentir novamente dentro da zona de conforto que um dia foi: minha casa, eu posso extrapolar os limites do que me é imposto por ser isso (um homem) e no grito mais rouco que for esbravejar toda minha ira por não ter notado como as coisas, aos poucos, degringolavam de déu em déu. Nada volta. Atingir uma certa idade é como ultrapassar barreiras finas, feitas de papel vegetal, com socos, rasgos, nada simples, nada folgado: às vezes esses partos pelos quais passamos em ritos de transição são mais dolorosos do que o parto original. Afinal de contas, no parto original o choro é perdoado e, após o choro, sempre se ganha colo.(Tenho inveja dessas tribos indígenas e questiono porque são chamados de selvagens outras tribos asiáticas, tribos maori, grupos que vivem no interior da África, povos nômades do oriente Médio. Nesses lugares, as crianças passam por festas de transição, estabalecem um ponto, e a partir dali são adultas. Não sofrem um sofrimento prolongado e contínuo que aos poucos se esmaece com o tempo; levam a batelada na cabeça de uma só vez, e, após a recuperação do baque, se erguem e são adultas. Prontas para fazerem o mesmo com o que vier. Assim seria mais fácil, eu creio)

Um comentário:

Anônimo disse...

Me parece que uma onda de nostalgia atingiu você...

Pois é, é bom lembrar que um lugar, uma pessoa ou uma época foram bons de certa maneira. Mas sabemos que a vida está sempre caminhando para a frente e as mudanças sempre surgem para nos trazer novos desafios e felicidades e não adianta viver o que não está aqui no momento. E pior ainda, muitas vezes somos "jogados" em novas situações sem nenhum preparo o que pode acabar tornando tudo mais desesperador.