terça-feira, 23 de março de 2010

As professoras de Francês.

Desde que eu comecei a estudar Francês tenho passado por diversos cursos, tornando minha formação na língua bastante fragmentada. Por motivos vários que vão desde preço da mensalidade até a disponibilidade de horário e de tempo, eu passei até agora por alguns cursos de Francês em diferentes escolas, o que me permitiu uma visão mais ampla dos métodos de estudo bem como uma repetição enorme de coisas já vista, assim: cada começo de curso, eu reaprendo o passé composé (je suis allé, tu as mangé, elle est arrivé, voilà...). Entretanto, se posso destacar algo que faz dessas minhas inserções por essas diferentes escolas uma experiência divertida é que cada vez que entro eu me apaixono pela professora nova. Incrível. Professoras de Francês guardam consigo uma elegância natural de mulher balzaquiana, um certo ar sofisticado, divertido, como se viessem diretamente do Champs Elysèe. Como se conseguissem, ao mesmo tempo em que ensinam a língua, transmitir a utopia de que Paris é uma festa (como diria Hemingway).
Comecei minhas primeiras experiências com a lingua em um Centro de Estudos destinado a estudantes de escola pública. O curso, à princípio, seria bastante ineficaz porque era dado em uma sala com mais trinta pessoas. Sendo de graça, entretanto, não vi motivo para não frequentar. E qual não foi minha surpresa quando Mme. Silvana adentrou a sala: entre 35 e 40 anos, pele bronzeada mas com um bronze mediterrâneo, seios bastante fartos, o rosto com algumas sardas que davam à ela um ar juvenil e o cabelo longo, escuro e repicado. Dizia que repitissemos com ela o 'r' do Francês, um 'r' gutural, vindo da garganta, como ela mesmo dizia il comme du coul, mes elèves, tout le monde, e todos repetiam, inclusive eu, animado, sentado na primeira da frente.
Mais tarde Mme Silvana teve problemas de saude e se afastou do curso, dando lugar a Marcela. Fiquei inconsolável porque a essa altura eu já nutria por Mme Silvana o que eu não havia sentido nem mesmo pela professora do primário. Eis que tivemos a primeira aula com Marcela e foi uma grata surpresa: recém formada, ainda guardava consigo o jeito despojado da FFLCH e de uma recente viagem de mochilão pela França que fizera como presente por ter concluído o curso de Letras. Uma massa de cachos loiros, olhos azuis, pele bem branquinha, all star e um jeitinho aéreo, uma fala arrastada, um Francês que ela pronunciava sem sobrecarregar o 'r' e o 'l'. Ninguém lhe dava muita atenção porque ela falava baixo. As pessoas foram desistindo do curso, e eu continuava firme. As aulas passaram a ser praticamente entre mim e ela, enquanto o resto (o resto literalmente, porque a essa altura restavam quatro ou cinco pessoas) conversava. Até o dia em que, sentado na porta da sala, esperando a aula começar, ouço a vozinha fraca dela dizendo: Tu es seule aujour'dui, Leonardo. Ça va être toi et moi, seulement...
Não lembro ao certo porque sai de lá: imprevistos com o horário, creio eu. De fato, quando retornei ao curso, já em uma escola privada e com um material decente, conheci Carol. Mais do que professora, ela era praticamente uma das alunas do curso tamanho seu despojamento e capacidade de descontração - todos, inclusive eu, adoravam sua aula. Cabelos curtinhos, óculos de aro grosso, um ar intelectual complementado pelas camisas brancas que ela usava. Conversávamos muito, nos intervalos das aulas - ela me emprestou Madame Bovary em Francês, porque segundo ela Flaubert no original era um deslumbre. Um dia, dissertando sobre sua tese de mestrado, ela comentou que se tratava de desvendar os traços da loucura em Maupassant. "É no sul da França, Maupassant?" "Não, Leo, Maupassant é um escritor". É, seu nivel realmente era muito acima do meu.
Recentemente tive que mudar de escola e, assim que fiz a matrícula, me amedrontaram com as descrições da professora. Dalva, seu nome. Imaginei uma velha de chale, um tipo meio Edith Piaff, arrogante. Sábado passado entrei na sala atrasado. Novamente eram poucos alunos e a moça morena e bonita, com os cabelos presos num coque displicente desses que se fazem meio por acaso, vestida de saia, pernas à mostra, atendeu a porta assim que bati. No começo pensei que era uma aluna, mas não.
- Tu es Leonardo, n'est pas? Salut, alors, je suis Dalva, ta nouvelle professeur!

2 comentários:

Jujuba disse...

aHAHAHAHA MUITO BOM LEO, ADOREI

Jéssika (Jé ;) disse...

Ahh Léo, vc me fez pagar um pau pro design do seu blog (tô conhecendo-o agora) e morrer d curiosidade d ler o q não dá.
Qria taanto conseguir manter um blog assim! *.*
Mas seus textos tão mto bons, despojados, reais, interessantes, bem escritos.
É, colega jorn, ganhou uma nova visitante! ;)
Beijão, boa semana!