sábado, 31 de julho de 2010

Azulejo

Estava coando o chá e lembrei de você. Fui coando e lembrando e, sem querer, transbordou o chá na xícara e foi se espalhando chá pela pia inteira, um infortúnio. Tive que correr para alcançar o pano mais próximo e contar esse vazamento de você e desse chá sobre a pia. Tenho andado muito por aí. Numa dessas andanças descobri uma feira no final do bairro que vende chás de toda espécie. Artemísia, camomila, citronela. Erva cidreira. Agora ando tomando. Nesses dias de calor em pleno inverno é quase um contra senso tomar chá e tomar sopa, mas tenho evitado a cafeína para ter umas noites de sono mais tranqüilas – e como você bem sabe, você que já dormiu comigo muitas noites, eu não consigo ir pra cama sem ter uma xícara na mão. Por isso inventei esse novo hábito. Artemísia, melissa, anis estrelado. Ontem fui buscar manjericão na feira e encontrei Caio e Suri e me pergutaram de você, como você estava, quando voltava. Disse que estava gostando do curso, que estava feliz, que estava bonita nas últimas fotos que eu vi e que voltaria no final do ano. Eles se despediram animadamente, Caio e Suri, e partiram para o final da feira onde vendia pastel. Eu prossegui meu caminho e levei um maço de manjericão bem verde pra casa. Depois, tive que atravessar a rua inteira para voltar para nossa rua e dei de cara com eles de novo. Passamos em frente à barraca dos chás. Guaco, capim santo, erva doce. Canela. Resolvi convidar os dois para um chá aqui em casa, essa casa anda tão vazia sem você, e mesmo quando eu faço um bule de chá sempre sobra e fica gelado, depois, e fica tão ruim de beber que eu acabo jogando fora. Eles aceitaram e ficaram de passar aqui em casa no final da tarde. Fomos conversando. Suri é a mais nova professora do departamento. Conseguiu passar no concurso. Senti que Caio estava desanimado. Não compõe nada há semanas. Coitado. Pensei em você novamente, e disse que talvez ainda tivesse aquele disco do Stan Getz que você disse que te ajudava em seu processo criativo. Fui buscá-lo e não achei. Ele está aí contigo, o disco do Stan Getz? Não lembro de você tê-lo levado. Enfim. Fomos conversando e eu fui coando o chá, e de repente continuei falando de você e do seu disco e da voz suave da Astrud Gilberto e quando dei por mim o chá foi transbordando da xícara, um copo de chá doce para tudo quanto é lado. Sorte que temos um rodinho de pia aqui em casa, pensei. Suri admitiu que sempre achou esse utensílio doméstico um desperdício, disse que nunca usava ele. Preferia deixar a pia secando ao natural, ou empurrar a água com as mãos mesmo. Sei lá, eu sempre gostei de ter um rodinho de pia. E foi útil para recolher o chá derramado. Eles acabaram indo embora sem chá nem disco do Stan Getz. Quando você volta? Comprei uns novos sabores, acho que você vai gostar. Hibisco, camélia, jasmin. Flor de laranjeira. Hortelã, para o hálito e para a alma. Saudades, imensas, viu?

4 comentários:

hybisco disse...

"hibisco".... ^^

companheira cronópia disse...

a primeira coisa que veio a minha cabeça, sinceramente, foi. ''..., como você é bonitinho"

companheira cronópia disse...

espero o próximo

Mirrah disse...

pão, café, mamão, para te alimentar, depois levar...